terça-feira, 16 de março de 2010

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Era uma noite qualquer quando tudo começou. Uma frase de abertura como essa pode deixar enfadado o assíduo leitor, já cansado da forma trivial que todas as histórias insistem em começar. Mas é assim que as coisas são, e rebuscar a história seria dizer inverdades, ou mentiras, diria alguém mais direto. Posso também ouvir críticas de que essa explicação enfada ainda mais que a simples frase, mas ao menos assim o leitor fica avisado, de que o conteúdo do texto que segue é o mesmo que já leu mil vezes em revistas de fofoca ou caixas de cereal, e pode parar a leitura agora, sem mais gastar o seu tempo aqui, e já perdoa-me por tê-lo ocupado tanto. Aos que ficam, a história segue.
Alfredo dormia profundamente quando o despertador cumpriu sua ingrata função de devolvê-lo a consciência, e como recompensa recebeu a habitual pancada que o desligava. Vida ingrata do despertador, que como afronta, tocaria alguns minutos mais cedo, se fosse capaz de tomar essa decisão. O máximo que faz é se atrasar um pouquinho a cada dia, mas nem isso é por vontade própria, e sim por erros de regulagem instrínsecos à sua construção, bem como às invioláveis leis da física que afetam a todos, inclusive, é claro, aos despertadores. Mas nada disso passou pela cabeça de Alfredo nesse momento, era a garrafa de água dentro da geladeira que lhe atraia agora, e era pra lá que se dirigia o nosso protagonista, quando uma mariposa na parede o fez lembrar do sonho que estava tendo quando o despertador o acordou. Não lembraria se não tivesse sido acordado no meio dele de forma abrupta, e deveria agradecer ao despertador, mas também isso não lhe passou pela cabeça. A lembrança do sonho não trouxe nenhum choque, até a mariposa se mover. "Descobri o sentido da vida!". E era um fato. Naquele momento, Alfredo realmente tinha descoberto o sentido da vida.
A velha mulher atendeu o telefone que tocava.
- Mãe, tô com um problemão.
- Que foi filho, algo grave?
- Descobri o sentido da vida, mas eu juro que foi sem querer!
- Ora essa Alfredo, eu já não te disse pra não descobrir essas coisas?
- Mas eu já disse, foi sem querer!
- Pois sim, é sempre sem querer, mas já não importa, vamos dar um jeito, filho.
- O que eu faço?
- Toma meio litro de vodka pura, sem gelo.
- Isso vai me fazer esquecer o sentido da vida?
- Tomara.
- É, tomara.
- Boa sorte, filho.
- Obrigado, mãe.

No fim deu tudo certo, e Alfredo pode voltar a ser infeliz como tanto gostava.

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